quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

“Não ao duto do Comperj” domina primeira audiência pública sobre este empreendimento

A perspectiva deste blogueiro sobre a audiência do duto, realizada em Maricá.

Por: Cássio Garcez*



Na Primeira Audiência Pública sobre o Emissário Terrestre/Submarino do Comperj, realizada no dia 24 de janeiro de 2012, em Maricá, representantes da sociedade civil, moradores, pescadores, ecologistas e outros indignados manifestaram toda a força de seu repúdio ao empreendimento através da unanimidade e da resistência. O evento, que começou às 19h20 e se estendeu até às 0h40 do dia seguinte, manteve um quorum consistente de interessados até o seu final, apesar de grande parte das pessoas ter sido obrigada a se retirar mais cedo devido ao adiantado da hora.



Faixas de protesto afixadas por manifestantes na entrada da audiência. Foto: Cássio Garcez.



Embora se notasse um considerável investimento dos organizadores na estrutura física do evento, alguns problemas quase inviabilizaram o início dos trabalhos, entre eles falhas na iluminação e no sistema de som. Já na composição da mesa, a ausência do Ministério Público foi questionada por várias pessoas, que chegaram a duvidar da legitimidade da audiência por causa disso.





Plenária lotada de moradores, ecologistas, pescadores e outros indignados com o projeto do duto. Foto: Cássio Garcez




Também na hora em que a população esperava se fazer ouvir na plenária, o presidente da CECA (Comissão Estadual de Controle Ambiental) e também presidente da mesa diretora, Sr. Antonio Carlos Gusmão, procurou criar dificuldades ao direito à voz de atores sociais, fugindo assim aos ritos preconizados pela própria organização do evento. Mas, acabou valendo a vontade da maioria e o que diz a Resolução 35 do Conema, na participação de todos os que se inscreveram para falar. "Não ao duto do Comperj” foi a tônica dos discursos, do recado à Petrobras, à Cepemar (autora do EIA/RIMA) e ao Inea, e também o grito de guerra puxado por um morador em determinado momento da audiência.



Mesa diretora com o Sr. Antônio Carlos Gusmão no comando da audiência. Foto: Cássio Garcez.






Em praticamente todas as falas dos especialistas da sociedade civil, foi dito que o projeto do duto era inaceitável do ponto de vista técnico e socioambiental e que o EIA/RIMA era falho e inconclusivo (quando não "vagabundo"). Algumas denúncias foram feitas por ecologistas e por moradores, como a de repasse de informações falsas por equipes da Petrobras sobre o duto a pescadores e o desrespeito aos direitos humanos em um suposto e suspeito processo prévio de preparação para as obras. Alguns cidadãos se exaltaram ao discursar, outros se emocionaram até quase às lágrimas e outros foram mais comedidos em suas colocações. Mas todos eram unânimes em afirmar que não queriam o duto, devido aos riscos de degradação do meio ambiente e da perda da qualidade de vida, além da inconsistência ou lacunas de informações sobre o empreendimento.




O engenheiro Izidro Arthou, contestando dados do EIA/RIMA. Foto: Cássio Garcez



No entanto, na hora das respostas dos representantes da Petrobras e da Cepemar, estes retrucavam com os mesmos dados que estavam sendo objeto das críticas. E acrescentavam, como numa gravação: "a tecnologia usada no duto é das mais avançadas no mundo e as substâncias descartadas estarão dentro dos parâmetros legais". E ponto. Só que esta repetição mecânica e evasiva parece não ter convencido ninguém. Muito pelo contrário.



A inconsistência das respostas dos técnicos, o cinismo do representante da Cepemar, Sr. Albertone Sant’Anna e a desfaçatez do funcionário da Petrobras, Sr. Cláudio Ribeiro, reforçaram a tese de que o emissário é uma clara tentativa de a Petrobras "entubar" à força a população de Maricá, especialmente moradores de Itaipuaçu, com o que o Comperj produzirá de pior. Isso porque, enquanto este pólo petroquímico, também impactante, criará empregos, renda e mais desenvolvimento para Itaboraí e o país, o duto só produzirá prejuízos, seja devido ao risco do transporte de poluentes químicos por terra, seja pelo seu descarte no limpo litoral de Maricá, ainda que os efluentes sejam tratados e estejam dentro dos parâmetros legais. Assim, se justifica grande parte desse antagonismo popular ao empreendimento

Complementando este posicionamento, questiona-se: existirá medida compensatória que poderá compensar, ainda que em parte, as perdas que a população local e o meio ambiente sofrerão com o descarte de toneladas diárias de porcarias petroquímicas, repito, mesmo tratadas e dentro dos parâmetros legais? Haverá compensação suficiente aos estragos à limpidez, à biodiversidade e à balneabilidade daquele belo trecho do litoral? Ou à contaminação e ao afugentamento de espécies marinhas? Ou aos danos à pesca e às famílias de Maricá e de Niterói que dela dependem? Ou ainda aos prejuízos às moradias, às atividades e aos negócios direta e indiretamente ligados a uma região praiana e turística como aquela? Até para quem não conhece o litoral de Maricá não é difícil saber a resposta.



Assim, a mensagem da população aos gestores ambientais e aos empreendedores na audiência foi clara: fora duto do Comperj em Maricá. E cuidado a Ceca e o Inea no cumprimento dos trâmites processuais, tanto no licenciamento quanto no registro da audiência. Estamos de olho e indignados.



Breve histórico do duto e da luta popular


O emissário terrestre/submarino do Comperj, projeto da Petrobras, visa a transportar efluentes industriais (óleos, graxas, fenóis, cianetos, etc., ou seja, “toda a tabela periódica”, segundo técnico de licenciamento do Inea) do Complexo Petroquímico de Itaboraí (Comperj), para descartá-los a apenas dois quilômetros da Praia de Itaipuaçu e a quatro das Ilhas Maricás (trecho de grande importância socioambiental, turística e pesqueira). Tal descarte impactaria também a parte marinha do Parque Estadual da Serra da Tiririca, a APA de Maricá e praias niteroienses, segundo estudos de vários coletivos da sociedade civil organizada. A empresa, através da Cepemar, apresentou como alternativa de descarte a Baía de Guanabara, evidentemente tão inadequada quanto a primeira. Embora houvesse uma terceira solução, o descarte 100% limpo, tecnologia mais avançada e já adotada na Refinaria Capuava, em São Paulo (também da Petrobras), curiosamente sequer foi aventada como opção. Assim, atores sociais que antevem ameaças ao meio ambiente e à qualidade de vida de moradores e usuários, vem lutando desde janeiro de 2011 contra tal projeto, denunciando falhas e a inconclusividade do EIA/RIMA, além de pleitear a adoção de um projeto menos impactante e de novos e melhores estudos. Existem algumas mobilizações virtuais, entre elas um abaixo-assinado (http://www.peticaopublica.com.br/PeticaoVer.aspx?pi=foraduto), um blogue (http://foradutodocomperj.blogspot.com) e uma causa no Facebook (http://www.causes.com/causes/604328-diga-n-o-ao-emiss-rio-submarino), além de vários artigos circulando por redes sociais (como: http://sositaborai.blogspot.com/2012/01/acreditem-se-quiser-comperj-cala-tutela.html)





*Cássio Garcez é psicólogo, mestre em Ciência Ambiental, pós-graduado em Planejamento Ambiental, Secretário do Conselho Consultivo do Parque Estadual da Serra da Tiririca, guia ecológico e coordenador do Ecoando – Ecologia & Caminhadas, grupo de caminhadas ecológicas e educação ambiental.











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