quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Maricaenses repudiam emissário do Comperj

Moradores de Maricá e outros atores sociais presentes na Primeira Audiência Pública sobre o emissário terrestre/submarino do Comperj, realizada no último dia 24, em Inoã, repudiaram de forma unânime e apaixonada este projeto que viza a despejar toneladas de efluentes industriais na Praia de Itaipuaçu.

Estamos elaborando um texto mais completo para noticiar como foi esta tumultuada audiência. Mas, aproveitamos para adiantar o discurso deste blogueiro, que participou do evento como secretário do Conselho Consultivo do Parque Estadual da Serra da Tiririca e presidente do Grupo de Trabalho Duto do Comperj.

Eis o discurso: 

"Boa noite senhoras e senhores. Embora eu quisesse falar sobre o emissário (ou duto) do Comperj como ecologista, amante da natureza e guia ecológico que sou, me restringirei às minhas posições institucionais de secretário do Conselho Consultivo do Parque Estadual da Serra da Tiririca (Peset) e de presidente do grupo de trabalho (GT) sobre o duto. Importante destacar que representamos a sociedade civil, ou seja, não somos “chapa branca”.



Em um ano de estudos do GT, descobrimos falhas graves (1) na concepção do projeto do duto, (2) no seu EIA/RIMA e (3) em alguns comportamentos adotados por equipes de comunicação social do Comperj e de representante do setor de licenciamento do Inea.



A lista de irregularidades é tão extensa que não seria possível lê-la aqui. Por isso, falarei apenas dos problemas mais urgentes, protocolando os outros em documento, além de meu discurso e Ata do Conselho onde foram debatidos alguns destes pontos.



Nós do GT, chegamos à conclusão de que a concepção atual do projeto do emissário é totalmente equivocada e inaceitável, devido aos enormes impactos que causaria ao local de descarte, mesmo com o tratamento de seus efluentes e a alegação de que eles estariam dentro dos parâmetros legais. Isso porque, basicamente, as substâncias descartadas, “a totalidade da tabela periódica” segundo técnico do Inea, possuem características conservativas e cumulativas, ou seja, se manteriam no ambiente por longo tempo. Da mesma forma, também a área marinha do Peset seria atingida por tais impactos.



Sobre o segundo eixo de problemas, descobrimos muitos erros no EIA/RIMA, indicando ser este de baixa qualidade, além de inconclusivo. Fora isso, a CEPEMAR, autora do documento, possui um extenso currículo de EIAS/RIMAS controversos, entre eles o do emblemático gasoduto do Rio Purus, na Amazônia.



No terceiro rol de problemas, recebemos denúncia de que equipes do Comperj estariam repassando informações falsas sobre o duto a pescadores da Rua 70. Uma dessas informações seria a de que o emissário descartará “água de refrigeração”, sem qualquer potencial poluidor. Da mesma forma, identificamos uma postura aparentemente complacente do setor de licenciamento do Inea ao EIA/RIMA em respostas a uma sabatina do GT sobre este documento. Consideramos que ambas as denúncias são graves e deverão ser averiguadas tanto pela Petrobras, quanto pelo Inea e o próprio Ministério Público. Igualmente os problemas citados anteriormente e aqueles relacionados no documento a ser protocolado, precisarão ser devidamente esclarecidos e corrigidos.



Por fim, o GT elaborou e o Conselho Consultivo do Peset aprovou por unanimidade três alternativas ao atual projeto do duto. A prioritária é a de descarte zero de efluentes, tecnologia já adotada pela própria Petrobras na Refinaria de Capuava (Recap), em São Paulo. Assim, propomos que o Inea exija ao Comperj a adoção do reuso e da depuração totais de seus efluentes, o que evitaria, desta forma, o verdadeiro estupro socioambiental que o emissário terrestre/submarino ocasionará a Maricá, caso o seu atual projeto não seja devidamente alterado.



Solicitamos, ainda, a realização de pelo menos mais três audiências públicas sobre o emissário, em Maricá.



Obrigado".

Cássio Garcez


ADENDOS DO GT AO DISCURSO:

1. BREVE APRESENTAÇÃO DO GT

Grupo de trabalho criado pelo Conselho Consultivo do Peset em reunião ordinária deste coletivo, no início de 2011. É constituído por organizações da sociedade civil e tem como objetivo identificar, estudar e propor alternativas às ameaças ligadas ao projeto do Emissário Terrestre/Submarino do Comperj, seja em relação à área do Peset e sua zona de amortecimento, seja referente a áreas de valor socioambiental próximas.



2. RELAÇÃO SINTÉTICA DAS ANÁLISES CRÍTICAS DO GT EM RELAÇÃO AO DUTO DO COMPERJ

2.1. obra inaceitável para um local tão importante do ponto de vista ambiental (ecossistemas, vida marinha), social (pesca, moradia, lazer), turístico (ecoturismo, turismo náutico, turismo subaquático, surfe) e econômico (comércio, pousadas, restaurantes, empreendimentos imobiliários) quanto o litoral de Maricá, devido aos impactos que trará mesmo com seus efluentes tratados e ainda que os níveis de contaminantes estejam respaldados por legislação pertinente;



2.2. desrespeito aos limites de uma unidade de conservação de proteção integral (o Peset) e de sua zona de amortecimento, por conseguinte, de uma lei federal (o SNUC). Isso pode ser constatado em mapa esquemático do próprio EIA/RIMA (Figura 10.1.2.11-12 do Diagnóstico Ambiental, p. 278), onde a pluma de efluentes, ainda que em baixa diluição, ocupa quase por inteiro a área marinha do Peset em determinada época do ano, além da instalação do duto estar prevista para um trecho de 5 km terrestres da zona de amortecimento provisória desta unidade de conservação;



2.3. fortes indícios de desconhecimento tanto da CEPEMAR, quanto da Petrobras e do Inea sobre os impactos de cada elemento e substâncias componentes a ser descartados pelo duto na biota marinha, terrestre e para a saúde humana;



2.4. negligência das instituições citadas no que se refere à importância do efeito cumulativo e conservativo dos contaminantes sobre a área de descarte. Em sentido inverso, ênfase das mesmas na diluição a ser proporcionada pelas correntes oceânicas aos efluentes;



2.5. EIA/RIMA falho, incompleto e inconclusivo, com lacunas de informação graves, métodos de coleta e interpretação de dados insuficientes e resultados questionáveis em diversos trechos destes documentos;



2.6. a empresa responsável pela confecção do EIA/RIMA do duto, a CEPEMAR, possui um extenso currículo de EIAS/RIMAS de baixa qualidade, os quais são emblemáticos aqueles do gasoduto do Rio Purus, na Amazônia, da Veracel Celulose e do Estaleiro Jurong, estes localizados na Bahia. No primeiro, o WWF classifica o documento como “fraco”, cobrando a realização de novo EIA/RIMA por outra instituição (vide: os artigos “A floresta vai entrar pelo cano” e “Cepemar na Bahia também é criticado”, disponíveis respectivamente em http://philip.inpa.gov.br/publ_livres/Press/2002/A%20Floresta%20vai%20Entrar%20Pelo%20Cano-Cartacapital-2002.pdf e http://onggamba.wordpress.com/2011/08/-1/cepemar-na-bahia-tambem-e-criticado-na-sociedade/);



2.7. contaminação de toda a cadeia alimentar e afugentamento de espécies como baleias e golfinhos, entre outras, o que prejudicará atividades econômicas importantes para a área (pesca, lazer, turismo, etc.);



2.8. destruição de pelo menos uma nascente localizada no traçado do duto em Marica (logo acima do ponto de intercessão 5 do duto com o Córrego São Tomé, no Mapa de Recursos Hídricos, Anexo 09) , além de risco de vazamento e dispersão de efluentes em áreas úmidas, canais, rios e áreas ocupadas por populações humanas;



2.9. alta probabilidade de ocorrência de rompimentos do duto na transição entre a parte terrestre e marinha do mesmo, devido ao fato da Praia de Itaipuaçu ser considerada de "alta energia";



2.10. suposta complacência do Inea em relação ao EIA/RIMA, suposição esta observada em algumas respostas ao questionário enviado ao setor de licenciamento deste órgão pelo GT;



2.11. indícios de distorção de informações passadas por equipes técnicas do Comperj a atores sociais sobre o duto, como pescadores e outros, fazendo-os crer que os impactos do empreendimento seriam bem menores do que a realidade. Possível e criminosa forma de atenuar antagonismos e conflitos com esta metodologia. Incluímos em anexo, CD com vídeo de depoimento de pescador a esse respeito;



2.12. priorização pelo empreendedor de uma tecnologia que, embora esteja dentro de parâmetros legais, ou seja, o lançamento de efluentes industriais tratados no meio marinho através de um duto, já se encontra ultrapassada e continua a ser indesejável e nociva. A própria Petrobras domina a tecnologia de descarte 100% limpo e reúso total de efluentes, presente em uma de suas unidades petroquímicas, a Refinaria de Capuava, em São Paulo. Assim, o GT e o Conselho Consultivo do Peset propõem que esta tecnologia seja aplicada ao Comperj de forma prioritária, ao invés do emissário. Acreditamos que isso resolveria grande parte dos problemas citados.



3. ALTERNATIVA PRIORITÁRIA SEGUNDO O GT

Em reunião ordinária do Conselho Consultivo do Parque Estadual da Serra da Tiririca, conforme ATA que será protocolizada nesta audiência juntamente com lista de presença de seus membros e de publicação no Diário Oficial onde foi lavrada a legitimidade daquele coletivo de instituições da sociedade civil organizada, a plenária por unanimidade propôs a seguinte alternativa prioritária ao problemático projeto atual do Duto do Comperj, reforçando o que é preconizado no parágrafo anterior: “exigência de estudos para se estabelecer outras formas de destinação dos efluentes que não o descarte no mar ou em rios”. Ou seja, reitera-se a proposta do reuso total de efluentes e de descarte 100% limpo ao Comperj.





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