Quem quiser e puder contribuir com este documento através de depoimentos, pareceres, fotos, abaixo-assinados, estudos, etc., basta comparecer ou ligar para o MPE (PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE TUTELA COLETIVA DE DEFESA DO MEIO AMBIENTE DE NITERÓI - Rua Visconde de Sepetiba, 935, 7º andar, Centro) e pedir mais informações. O número da petição é: 2012.00500277.
Além de ser um direito de todo cidadão consciente, é também seu dever colaborar com este processo legal. E é muito mais simples e acessível do que se costuma imaginar. Então? Participe!
EXCELENTÍSSIMO SENHOR
LUCIANO MATTOS
PROMOTOR DE JUSTIÇA DA
SEGUNDA PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE TUTELA COLETIVA DE NITERÓI
Ilustríssimo Senhor,
A ASSOCIAÇÃO DE
PRESERVAÇÃO AMBIENTAL DAS LAGUNAS DE MARICÁ – APALMA - fundada em
23/02/1996,
vem por intermédio de sua presidente, Flávia Lanari Coelho,
com o devido acatamento perante Vossa Excelência, a fim pedir providências
Institucionais deste Órgão Ministerial, com fulcro no artigo 129 e seguintes
c/c artigo 225 e seguintes, todos da nossa Carta Magna, pelos motivos de fato e
de direito que doravante passa a expor:
Douto Curador do Meio Ambiente:
A Associação subscritora desta petição, que tem como
finalidade a defesa dos recursos hídricos, do meio ambiente, dos pescadores
tradicionais e da Restinga de Maricá, que também atua como membro do Conselho
Consultivo do Parque Estadual da Serra da Tiririca e em seu Grupo de Trabalho
Duto do Comperj (GTDC), além de representação no Comitê da Bacia Hidrográfica
da Baía de Guanabara e na instalação do Sub-Comitê de Maricá-Guarapina, ao se
aprofundar com seus pares no estudo e análise do projeto do duto terrestre/emissário
submarino do Complexo Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro (ETSCOMPERJ), empreendimento
da Petrobras em Maricá, assim como na avaliação de seu licenciamento ambiental,
viu-se na obrigação de requisitar a este Órgão Ministerial as devidas
providências a fim de salvaguardar não apenas o meio ambiente deste e de outros
municípios litorâneos próximos, mas também garantir a lisura do processo, assim
como a observância da ética e o respeito à sociedade.
Dentre os argumentos que nos levaram a buscar a intervenção
do Ministério Público, listamos a seguir aqueles os quais consideramos os
principais, sem, no entanto desprezar a importância dos que não foram citados e
que deverão ser alvo de pesquisa mais aprofundada:
- a irrisória distância do dispersor de efluentes
petroquímicos (2 km
na proposição original e 3,9
km na atual) de uma das praias mais valorizadas de
Maricá para a recreação, o banho de mar, o esporte, o turismo, o
empreendedorismo ligado ao litoral (bares, restaurantes, hotelaria, etc.) e a
pesca – seja artesanal, esportiva, de lazer, profissional ou tradicional, da
zona de amortecimento e da área marinha do Parque Estadual da Serra da Tiririca
e das Ilhas Maricás (4 km
na proposição original e 2,1
km na atual), importante criatório e refúgio de peixes,
moluscos e crustáceos e reconhecida área pesqueira da região;
- os altos riscos de impacto socioambiental referentes ao
efeito cumulativo e conservativo das substâncias que, mesmo rigorosamente
tratadas e diluídas pelas correntes oceânicas, como defendem técnicos da CEPEMAR
e do próprio INEA, continuarão a contaminar de forma incomensurável, contínua e
incontrolável as áreas para onde forem levadas;
- a desconsideração dos limites de uma unidade de
conservação de proteção integral (PESET),
a área marinha integrante do Parque e de sua zona de amortecimento, e, por
conseguinte, da Lei Federal Nº 9.985 (que instituiu o Sistema Nacional de
Unidades de Conservação)[1].
- os fortes indícios de desconhecimento, tanto da CEPEMAR,
quanto da Petrobras e do INEA, sobre a composição e os impactos dos efluentes a
serem descartados pelo emissário na biota marinha, terrestre e para a saúde
humana;
- a negligência das instituições citadas no item anterior no
que se refere à importância do efeito cumulativo e conservativo dos
contaminantes sobre a área de descarte; e, em sentido inverso, ênfase das
mesmas na diluição a ser proporcionada pelas correntes oceânicas aos efluentes;
- o efeito sinérgico em impactos ambientais da construção deste
emissário de efluentes concomitante ao descarte de material de dragagem do
Porto do Rio de Janeiro a poucos quilômetros dali, nas proximidades da Ilha
Rasa, a um gasoduto e a um porto de proporções gigantescas, ambos estes em
Jaconé e em fase de elaboração de projeto;
- o EIA/RIMA escandalosamente falho, incompleto e
inconclusivo, com lacunas de informação graves, métodos de coleta e interpretação
de dados insuficientes e resultados questionáveis em diversos trechos destes
documentos;
- a carência de consulta a estudos acadêmicos sobre a biota
das Ilhas Maricás e sobre a área marinha do Parque Estadual da Serra da
Tiririca, além de coletas de dados insuficientes pela CEPEMAR sobre as mesmas;
- a carência de referências bibliográficas em diversos
estudos do EIA;
- a desconsideração da Corrente das Malvinas e dos vórtices
temporários no EIA/RIMA, frequentes em todo o litoral afetado, conforme
pesquisas científicas e trabalhos acadêmicos, especialmente na área marinha do
PESET. Esta corrente, é importante ressaltar, traz consigo, além da fauna
marinha oriunda do extremo sul do planeta, como leões marinhos e pinguins,
microorganismos marinhos que são a base da cadeia alimentar, sendo os mesmos
extremamente suscetíveis a impactos como os que serão provocados pelos
efluentes do emissário, o que trará consequências difíceis de serem estimadas
para a ecologia marinha local, regional e mesmo internacional. Tais
consequências, estariam, assim, ferindo o Princípio da Precaução;
- o fato de a empresa responsável pela confecção do EIA/RIMA
do duto, a CEPEMAR, possuir um extenso currículo de EIAS/RIMAS de baixa
qualidade[2], o
que pode indicar uma suposta priorização do empreendedor, ao escolhê-la, pelo
cumprimento de prazos da obra do que pela qualidade do estudo;
- a contaminação de toda a cadeia alimentar e o
afugentamento de espécies como baleias e golfinhos, raias e tartarugas,
lagostas e polvos, entre outras, o que prejudicará atividades econômicas
importantes para a área (pesca, lazer, turismo, etc.);
- a existência de uma comunidade de pescadores artesanais,
que utilizam a área de impacto direto do emissário, cujo nível de produtividade
de pescado é o segundo maior do município de Maricá[3],
perdendo apenas para a pesca praticada no sistema lagunar;
- a existência de uma comunidade de pescadores artesanais em
Itaipu, área de entorno do PESET e que também poderá ser atingida pelos
impactos negativos da instalação do emissário e assim contribuir para a
extinção dessa prática centenária de pesca na região. Este fato representaria
um dano cultural antropológico, além do ambiental, e um conseqüente descumprimento
da lei municipal em vigor, tendo em vista que a pesca artesanal de Itaipu é
patrimônio cultural imaterial do Município de Niterói, assim definida pela Lei
Municipal 2874/2012;
- a destruição de pelo menos uma nascente localizada no
traçado do duto, em Itaboraí (logo acima do ponto de intercessão 5 do duto com
o Córrego São Tomé, no Mapa de Recursos Hídricos, Anexo 09), além do risco de
vazamento e dispersão de efluentes em áreas úmidas, canais, rios e áreas
ocupadas por populações humanas;
- a alta probabilidade de ocorrência de rompimentos do duto
na transição entre a parte terrestre e marinha do mesmo, devido ao fato de a
Praia de Itaipuaçu ser considerada de "alta energia", “susceptível à
incidência frequente de ondas de tempestade com alto poder erosivo”;
- os indícios de distorção de informações repassadas por
equipes técnicas do COMPERJ a atores sociais sobre o duto, como pescadores e
outros, fazendo-os crer que os impactos do empreendimento seriam bem menores do
que a realidade, conforme provas audiovisuais já protocoladas junto à Comissão
Estadual de Controle Ambiental - CECA, no dia da referida audiência, e também
anexadas a esta petição;
- as afirmações do ex-presidente da FEEMA, Sr. Axel Grael,
que conduziu o licenciamento do COMPERJ quando dirigia o órgão, em 2007, sobre
uma mudança inesperada dos planos da Petrobras no compromisso assumido com ele
"de recircular o esgoto do polo petroquímico" (Jornal O
Globo-Niterói, Coluna do Gilson Monteiro, 18/3/2012) e do "lançamento dos
efluentes na Baía de Guanabara" e não em Maricá, como alternativa
prioritária ao descarte (Jornal O Globo-Niterói, Coluna do Gilson Monteiro,
25/3/2012);
- a priorização pelo empreendedor de uma tecnologia que,
embora possa estar dentro de parâmetros legais, como afirmam e garantem seus
representantes, ou seja, o lançamento de efluentes industriais tratados no meio
marinho através de um emissário, já se encontra ultrapassada e continua a ser
indesejável e nociva;
- o fato de que a própria Petrobras domina tecnologia de
descarte 100% limpo e reuso total de efluentes, presente em uma de suas
unidades petroquímicas, a Refinaria de Capuava, em São Paulo , tecnologia
essa superior à preconizada pelo atual projeto do emissário e curiosamente não
citada no EIA/RIMA;
- a reunião ordinária do Conselho Consultivo do Parque
Estadual da Serra da Tiririca realizada em 19/8/2011, conforme ATA
protocolizada na CECA e anexada a esta petição, onde a plenária, por
unanimidade, propôs, como alternativa prioritária ao problemático projeto atual
do emissário do COMPERJ, a “exigência de estudos para se estabelecer outras
formas de destinação dos efluentes que não o descarte no mar ou em rios”;
- o fato de que o EIA negligencia problemas estruturais e
acidentes registrados em outros empreendimentos do mesmo gênero no país, que
deveriam servir de parâmetro comparativo, como o duto Cabiúnas, que teve
interrompida sua operação pelo IBAMA, em face dos inúmeros problemas que
afetavam, especialmente, o Parque Nacional de Jurubatiba (Macaé, Carapebus,
Quissamã), no Estado do Rio de Janeiro;
- a não apresentação no EIA dos números de ictiofauna; assim
como de estudos oceanográficos da plataforma interna e da ictiocenose, embora
os dois últimos existam e sejam relevantes para a compreensão de uma série de
variáveis;
- ao contrário do que foi mencionado no capítulo 12 do EIA,
a Serra de Inoã encontra-se recoberta por densa vegetação remanescente de Mata
Atlântica, com fauna e flora típicas, formando importante corredor ecológico
com a Serra da Tiririca;
- o EIA não especifica os sítios históricos e arqueológicos
existentes na área em questão;
- a carência do inventário da fauna e da flora dos locais
por onde passará o duto;
- o levantamento socioeconômico do EIA encontra-se defasado;
- o mesmo estudo ignora o grande fluxo turístico no
município, observado pelo IBGE/2000, que aponta 46% dos domicílios como uso
ocasional, logo voltado para o turismo do tipo veraneio, no mesmo patamar dos
municípios da Região dos Lagos;
- a pluma prevista, de 1.600 m a partir do ponto
de dispersão, é subdimensionada ante as intensidades das correntes e da forte
dinâmica costeira;
- o processo de licenciamento do empreendimento apresenta
incorreções graves e episódios suspeitos, os quais devem ser rigorosamente
investigados, tais como:
(1) prazo para consulta pública ao EIA/RIMA vigente durante
as festas de fim de ano e período de férias, entre os anos de 2010 e 2011;
(2) EIA/RIMA
disponibilizado em plataforma digital extremamente pesada e de difícil acesso e
consulta por atores sociais interessados, fator impeditivo para a divulgação
via Internet;
(3) realização de
apenas duas Audiências Públicas (APs) sobre o empreendimento, uma em Maricá e
outra em Itaboraí, não contemplando Niterói, município que poderá ser afetado
pelos efluentes;
(4) liberação de verba de contrapartida do ETSCOMPERJ para
Maricá, antes da conclusão do processo de licenciamento daquele;
(5) ausência de resposta do INEA e da CECA sobre os
questionamentos protocolados por representantes da sociedade civil no período
imediatamente posterior às APs.
Com base nos dados acima
apresentados destacamos que o EIA/RIMA do ETSCOMPERJ é inconclusivo e
incompetente por negligenciar alguns dos objetivos mais básicos desse tipo de
documento. Assim, reafirmamos o pedido de providências na forma da lei,
exigindo-se que os responsáveis devam:
(1) caracterizar os impactos ambientais que serão provocados
pelo empreendimento; (2) demonstrar de forma ampla e integrada o ambiente que
será afetado, proporcionando fácil compreensão à população;
(3) apresentar todas
as alternativas técnicas disponíveis para a consecução do empreendimento e;
(4) divulgar de forma efetivamente ampla e acessível à
população as informações apresentadas no documento. Assim, considera-se
necessária a confecção de outro EIA/RIMA, por empresa diversa da CEPEMAR,
devido também à reconhecida incompetência técnica da mesma neste tipo de
empreitada[4];
Constatados tantos
equívocos em um processo público e diante de tantas falhas apontadas no
referido EIA/RIMA, suplicamos a atenção deste colendo Ministério Público, para
as considerações finais e recomendações:
- A insuficiência generalizada da metodologia e da
bibliografia utilizadas pela CEPEMAR e a negligência às peculiaridades e
características socioambientais, culturais e econômicas relevantes, entre
outras faltas, denúncias e falhas graves, confrontam com a escolha do local
para o lançamento de efluentes como sendo supostamente o mais adequado.
·
Considera-se
que a opção ideal deva levar em consideração o respeito: às vulnerabilidades da
área, aos limites da área marinha do PESET e da sua zona de amortecimento, à
corrente da ressurgência (que alimenta com seus nutrientes vários pontos da
costa), aos vórtices temporários tropicais (que possuem a potencialidade de
espalhar os contaminantes por área muito maior do que a estimada pela CEPEMAR)
e à riqueza socioambiental e cultural da área como um todo. Para isso,
recomenda-se o uso da tecnologia de descarte zero (citada anteriormente) ou, na
inviabilidade técnica desta, o prolongamento do emissário para além de 30 km da linha de praia,
conforme estudos de especialistas no assunto.
- A omissão de uma tecnologia menos impactante e mais
avançada que a apresentada pela CEPEMAR no atual EIA/RIMA do emissário, cujo
domínio e operação são da própria Petrobras (Refinaria de Capuava, em São Paulo ), é falha
grave e corrobora as suspeitas de manipulação de informações por aquela.
·
Assim,
recomenda-se que esta alternativa não apenas conste do novo EIA/RIMA, mas que
seja priorizada frente às demais, devido aos menores impactos que serão
ocasionados com a sua adoção;
- Diante das graves denúncias de irregularidades, falhas e
suspeitas de manipulação, o processo de licenciamento do mesmo empreendimento perdeu
desta forma, sua lisura e, por conseguinte, sua legitimidade.
·
Recomenda-se,
pois, a sua imediata suspensão e a substituição por outro processo de
licenciamento que siga rigorosamente a transparência e os protocolos legais,
morais e éticos exigidos pela sociedade e o Estado de Direito;
- A ausência de Audiência Pública no município de Niterói,
corrobora o tópico anterior, já que alijou este município e sua população de
participar de um processo que é de seu total interesse e direito, ou seja, o
conhecimento dos riscos potenciais à sua área e a possibilidade de se
manifestar a esse respeito.
·
Desta
forma, recomenda-se a realização de pelo menos um evento como este em tal
município.
Nestes termos, pede deferimento.
Niterói, 19 de abril de 2012.
______________________
Flávia Lanari Coelho
Presidente
[1] Desconsideração esta flagrada no
mapa esquemático do próprio EIA/RIMA (Figura 10.1.2.11-12 do Diagnóstico
Ambiental, p. 278), onde a pluma de efluentes, ainda que em baixa diluição,
ocupa quase por inteiro a área marinha do PESET no verão, além da instalação do
duto estar prevista para um trecho de 5 km terrestres da zona de amortecimento
provisória desta unidade de conservação. Vale destacar que o PESET é uma
unidade de conservação de proteção integral administrada pelo próprio INEA e
que o seu Plano de Manejo se encontra em fase de elaboração. Assim, por ainda
não estarem concluídos os devidos estudos sobre sua área protegida, terrestre e
marinha, e sua biodiversidade, considera-se que vale desta forma, o Princípio da
Precaução: se há o risco do impacto, seja lá qual for, deve-se evitar a obra.
[2] A esse respeito, são emblemáticos os
exemplos do gasoduto do Rio Purus, na Amazônia, da Veracel Celulose e do
Estaleiro Jurong, estes localizados na Bahia. No primeiro, o WWF classifica o
documento como “fraco”, cobrando a realização de novo EIA/RIMA por outra
instituição (vide os artigos “A floresta vai entrar pelo cano” e “CEPEMAR na
Bahia também é criticado”, disponíveis respectivamente em http://philip.inpa.gov.br/publ_livres/Press/2002/A%20Floresta%20vai%20Entrar%20Pelo%20Cano-Cartacapital-2002.pdf
e http://onggamba.wordpress.com/2011/08/-1/cepemar-na-bahia-tambem-e-criticado-na-sociedade/).
[3] Conforme dados constantes no Relatório Técnico Parcial nº 4 do Projeto de
Monitoramento de Desembarque Pesqueiro no Município de Maricá/RJ, nos Meses de
Janeiro a Junho de 2011, de autoria da Fundação Prozee / OGX, publicado em
agosto de 2011.
[4] A
esse respeito, é oportuno lembrar que as lideranças máximas do setor ambiental
federal e estadual, a Ministra Do Meio Ambiente, Isabella Teixeira, e o
Secretário de Estado Do Ambiente, Carlos Minc, assumiram publicamente em
entrevistas (quando do acidente do vazamento da Chevron, na Bacia de Campos, em
2011), seu reconhecimento em relação à má qualidade de grande parte dos
EIAs/RIMAs produzidos no Brasil. Este parece ser o caso do EIA/RIMA produzido
pela Cepemar para o emissário.
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